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domingo, 16 de março de 2014

Até a Lua Clara


Apeteceu-me ...




                -Tens a certeza que não queres ficar por cá mais uns tempos Gabriel? – O Sr. António fumava o seu cachimbo e por entre ele balbuciava algumas atenções e olhava-me com um certo carinho disfarçado por pena. Não de mim, mas do facto de eu ter perdido a minha consciência, o homem que mais amava.
-Não Sr. António, mas muito obrigada por tudo o que fizeram por mim.
-Mas e o que vais fazer agora? – Questionou-me Afonso mais uma vez.
-Vou ter com a minha mãe, por agora é só isso que vou fazer.
Todos eles me foram levar ao aeroporto e por entre beijos, abraços e palavras atenciosas, havia ali o desdém preso no olhar, a pena cosida á angustia. Nunca tinham percebido o que me passou pela cabeça por não ter ficado em Lisboa depois do funeral, ignorando e jorrando no chão todas as lagrimas da minha mãe que me suplicavam para ficar em casa. Nenhuma palavra saiu das bocas deles acerca desse assunto, mas eu sabia que nenhum deles compreendiam a atitude que eu estava a tomar, porque nem eu próprio a compreendia. A única coisa que eu sabia era que precisava de me distanciar e foi isso que eu fiz. E agora de mochila as costas estou preparado para voltar para casa.
Durante o tempo que se esvaziou enquanto eu sobrevoava o meu mundo, escrevi para ti, como há muito tempo não fazia Clara.


Clara
Estou hoje a quebrar a promessa que fiz a mim mesmo há cerca de três anos atrás, aquela em que prometi que não te escreveria mais em condição alguma. Falei-te em todas as circunstâncias em que te poderias encontrar para me deixares sem norte. Incrível o meu estado excitado, zangado, angustiado mas acima de tudo esperançado por tu não dares qualquer sinal de vida, durante seis semanas.
Honestamente? Sempre pensei que me fosses responder, que me desses uma justificação incoerente, mas eu decerto acreditaria porque tinhas demasiado relevância em mim, estavas cravada na minha pele, pintada no meu corpo, afincada na minha mente e cosida ao meu pobre coração. Talvez ainda estejas.
 Agora ao fim de três anos, estou anestesiado, dormente e já pouco me importa promessas que te afiancei, a ti e a mim.
Vou falar-te acerca do meu último ano, porque nos restantes dois pouco me importa o que fiz ou deixei por fazer, o que vi, o que amei, o que me angustiou. Nesta altura do campeonato, somente o último ano me gravou como muitos outros não fizeram e hoje senti uma extrema necessidade de te falar.
Estou num avião, caminho a Portugal visto que passei o último ano em Londres e não, não vivi em nenhuma esquina. Se não mudaste, (espero que não), estarias orgulhosa de mim, tirei a carta e o meu curso, o meu último ano foi passado a trabalhar (não na rua) num pequeno teatro em Londres onde apesar de ter feito de tudo um pouco, fiz o que mais gostei: fiz do palco o meu circo apesar de somente por momentos perdidos entre peças teatrais, pujantes, belas. Aprendi a gostar daquela família que conheci entre aqueles cenários. 
Mas aquilo que me está a fazer escrever-te não e a minha alegria cozida ao meu trabalho, nem nada com semelhante relevância:
O meu pai faleceu. O homem que me educou, que me amo, que fez de mim aquilo que sou hoje, a minha nobre consciência. Morreu.
Não quero pena nem misericórdia, eu somente precisava de dize-lo. Hoje admito-o para mim mesmo, ainda continuo dormente mas admito-o.
Ele morreu, o homem que mais amo neste mundo, morreu.
É só Clara, hoje não tenho mais nada para te dizer. Continuo zangado, talvez não contigo, agora com o mundo.
Até a Lua Clara

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