Gabriel Brigas e Clara Papoilas –
O inicio
O
calor era tal que comia a pele escaldada que pensado ter réstia de hipóteses
face a tais temperaturas abrasadoras, usava e abusava de protector 50+. Há já
uma hora que estava sentada numa esplanada centrada num largo Espanhol, ao
longe conseguia avista-lo, ouvia a sua voz reconfortante, o quão bela era?
Dócil, baixa, sensual … Não agora, agora era alta, forte e algo áspera para que
pudesse chegar aos ouvidos de todos os que o admiravam a ele e às bolas que
saltitavam de mão para mão, da testa para o nariz, depois para o pé voltando
para as mãos. Queria estar junto a ele, a ouvi-lo de perto, mas por já ser
talvez o décimo espetáculo a que assisto, o encanto vai desvanecendo um pouco e
a sombra deste chapéu era tão sedutora que larguei o Gabriel por momentos, para
me vir poder saciar com uma bela água fresca. O meu pescoço pinga tanta água
que dava para encher uma garrafa semelhante a que agora bebi, os meus cabelos
ruivos teimam em soltar-se mas eu amarrei-os, não posso deixar que tenham vida
própria, não neste dia em que à sombra, estão perto de 40ºc. Acabou, as pessoas
começam a dispersar e vejo agora o dono do circo, o gerente da companhia, o
homem das contas dirigir-se a ele. Há cerca de 15 dias que chegamos a Málaga, a
principio Gabriel não fora assim tão bem recebido, os restantes artistas não se
mostram muito abertos aquele homem algo escuro que entrara pensando que tinha
os mundos na mão, quando se apercebeu que não eram mundos mas sim só laranjas,
a hostilidade desvaneceu e agora era elogiado a torto e a direito, os
trapezistas perguntaram-lhe se não queria fazer um número com eles visto
Gabriel ter umas luzes acerca do assunto, luzes que vinham da chama que Chapitô
introduzira nele. Andam a trabalhar nisso …
Para
mim? Para mim é complicado, vamos agora seguir para Madrid e depois para
Barcelona, queria ir a Pamplona, queria visitar as praias Espanholas, mas não é
isso que está no percurso, no mapa, nos planos. Nos meus planos também nada
disto estava traçado. Nos meus planos estava um verão romântico, aventureiro,
sedutor, quente e divertido. A única coisa que se concretizou foram as altas
temperaturas que afinal de contas não são assim tão bem recebidas pelo meu
organismo habituado à região Londrina onde moro. O último beijo que Gabriel me
dera foi na primeira vez que o vira em Lisboa, anda afastado de mim … Logo aí,
posso riscar o romântico, assim como o sedutor, aventureiro e divertido, porque
o cansaço come os músculos de Gabriel e quando chegamos ao hotel de 3* em que
estamos instalados, a cama é de tal forma sedutora que passado poucos minutos,
lá está ele envolto nos seus sonhos … Da última vez que o fora chamar, a
resposta dele fora: “-Já vou Martinha”. E que digo eu face a isto? Nada. Deixo
os meus dias voaram pelos nós dos dedos, anseio por dois segundos durante o dia
com ele e assim que os tenho contento-me com tal. Quando me tornei nesta Clara?
Quando? Quando passei a viver a minha vida conforme a de alguém? Agora. Ganho coragem
para falar sobre tal assunto ensurdecedor, quero questionar-lhe acerca da Marta,
quem é ela? Que vida tinha ele? O que se passara nos últimos anos? Eu contara-lhe
tudo, mas ele somente ouvira. Será que o conheço como a palma da mão, não, a resposta
é simples e pragmática. Achava que sim, mas agora apercebo-me que nem como a palma
da mão, nem como a do pé. Não o conheço e sempre que tento abordar tal assunto,
as pernas tremem, as mãos suam e eu gaguejo.
E
lá vem ele a correr para mim, com o seu sorriso hipnotizador, vou agora
conformar-me com os dois segundos a que tenho direito.
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