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quinta-feira, 30 de agosto de 2012

de : A Ruiva do Andar da Esquina.


"Pai
Não tenho muito a dizer-te porque te sacudi todas as palavras que te quis dizer quando ainda te sentavas no cadeirão em frente a televisão, quando ainda comias connosco à cabeceira da mesa e suplicavas à mãe que fizesse migas para ao almoço do dia seguinte. Passou um ano desde que fugiste de mim, de nós … Tenho vergonha de te dizer que só hoje me apercebi realmente das saudades que me matam, do quanto eu sinto a tua falta. Até a data, estava em tal estado de dormência que firam poucas as lágrimas que derramei por ti, esta noite tive oportunidade de pagar por isso e deitei cá para fora todas as piedosas, gordas e efémeras lágrimas que correm para ti.
Hoje apercebi-me que eras a minha consciência e no fundo não permitias que ela pesasse demasiado, para que eu possa sempre com ela nos meus braços. Espero que continues a ser.
Hoje chorei verdadeiramente por ti e por incrível que pareça, as lagrimas ainda não cessaram, teimosas orgulham-se em molhar-me o rosto.
Estou a escrever-te para te dizer tudo o que não consegui (o que é pouco), mas acima de tudo para te pedir perdão, por não ter estado contigo quando decidiste, ou Deus decidiu por ti, que deverias partir (espero que para um sitio melhor).
Crucifiquei-me todos os dias desde que morreste por não ter estado contigo o tempo suficiente, por não ter tido tantas conversas contigo como gostaria, por ter estado fora cinco anos a explorar uma esquina, afinal de contas foram cinco anos sem te ter a meu lado, o que equivalem a o quê? Dez mil anos? Cem mil? Mais tempo do que qualquer humilde homem possa imaginar. Perdoa-me também por não te ter ouvido quando me chamavas atenção, quando por exemplo, perdi um dedo. Mas por outro lado, não me perdoes porque penso que são esses pequenos e quase invisíveis pormenores que fazem de mim o homem que sou hoje, o homem que tão orgulhosamente criaste. Perdoa-me pelas mais mil e uma coisas, das quais eu neste momento não me recordo, mas decerto tu ficaste sentido comigo em variadas alturas da tua vida incrivelmente vivida.
Penso e espero que me perdoes, só dessa forma conseguirei enfrentar o que está para vir.
Quando soube do teu falecimento, senti-me de novo perdido. Profissionalmente, consegui finalmente ganhar sustento por fazer algo que me acalenta a alma. Algo de que facilmente te envaidecerias de mim. E o resto, por agora não importa. Mas perdi-me, o que faria eu sem ti? Vadiei por todos estes anos e passei a pente fino todos os minutos em que partilhei o mesmo ar que tu respiravas e depois de tal tarefa, questionei-me de novo: Como vou eu viver sem ti?
Foi então que a mãe mostrou-me um trilho que eu vou explorar: Viver como  tu gostarias que eu vivesse.
Decerto voltarei a escrever-te, mas não tão cedo. Por agora empenhar-me-ei em tal  rigorosa tarefa: Viver!
Nunca me esquecerei de ti. Fizeste-me o homem que sou hoje e o que eu mais gostaria era que tu te orgulhasses de mim, como eu me orgulho de ti e nada me deixa mais feliz por acreditar que realmente te orgulhavas de mim, do homem em que me tornei.
Amo-te pai, meu pai.
Janeiro de 2012"

 GABRIEL BRIGAS, de "A Ruiva do Andar da Esquina"

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